Os marinheiros na Umbanda - A linha das águas
Você conhece ou já ouviu falar dos marinheiros na Umbanda? Essa linha de trabalho tão querida nos terreiros, é composta por entidades maravilhosas, mas muita gente fala bobagem sobre eles. Então continue lendo esse artigo para entender mais sobre: Os marinheiros na Umbanda - A linha das águas.
Vamos começar quebrando o primeiro mito. Acredito que você já tenha ouvido em algum terreiro, uma pessoa falando algo do tipo, "ah o marinheiro estava bêbado, ou o meu marinheiro bebe demais." Primeiro que, estar bêbado é uma função fisiológica do nosso corpo, uma resposta de acordo com a quantidade de álcool que entra no nosso organismo, logo o marinheiro não tem mais corpo, ele é um espírito portanto não fica bêbado, a bem da verdade, marinheiro nenhum fica e insistir nisso é uma grande bobagem. "Ah mas quando o marinheiro está em terra, ele fica balançando de um lado para o outro." Essa é uma das suas formas de trabalhar, da mesma maneira que o baiano normalmente da seus rodopios e faz a sua dança durante as giras, ou do mesmo jeito que o caboclo fica batendo no peito ou o preto velho que fica estalando seus dedos, nada além do que formas fluídicas. O marinheiro no seu balanço, está trabalhando o ambiente e a própria energia do médium, este movimento de se balançar para um lado e para outro é muito parecido com o que os judeus fazem no muro das lamentações durante suas orações, e isso nada mais é do que o movimento ritualístico e o movimento repetitivo para alinhar os chákras e as energias de onde estão. Então não existe essa história que o marinheiro estava bêbado.
Agora, pode ser que o marinheiro fale para você, que ele bebeu um pouco demais, algo que também não será exagerado.
Mas não pára por aí e vamos abordar bastante coisas sobre os marinheiros. É importante salientar, que quando começamos a falar sobre os marinheiros, é necessário entender a origem deles. Os marinheiros tem origens assim como os baianos e os boiadeiros, nos rituais de encantaria. Esses cultos chamados pagãos, que entre os africanos e os indígenas lá no nordeste, influenciaram os rituais e fundamentos da umbanda. E os marinheiros também estão nesse grupo. Nós não podemos deixar de falar, principalmente do culto da barquinha, uma seita que tem lá no nordeste, onde todos os espíritos encantados vem com fardas de marinheiro.
Primeiro, pra entendermos o porquê do nome marinheiro e uma vez que fosse perguntado isso, as pessoas falavam "mas ele é marinheiro porque trabalhava no mar", se fosse assim então nós teríamos uma linha de soldados e uma linha de aviadores e isso não acontece. Portanto, o conceito do marinheiro nada mais é do que o espírito que leva embora as energias ruins e traz as energias boas. São espíritos que trabalham na transição energética e por que ele usa a forma fluídica de um marinheiro? Vamos lembrar que os escravizados quando vieram para o Brasil, acreditavam no mito de Aruanda, a cidade que ficava no além-mar. Esses cultos começaram a nascer no final da escravidão e nesse período já existiam 2, 3 e até mesmo 4 gerações que estavam no Brasil, e por esse motivo não eram originalmente africanos, não tinham tanto conhecimento assim da África e muito do que sabiam era de ouvir falar, então, muitos tinham a crença de que era do outro lado dos mares que ficava essa Aruanda, essa utopia da cidade deles. À partir daí, eles começaram a chamar de "kalunga grande", lembrando que existem duas kalungas; a "kalunga grande" que é o mar e a "kalunga pequena" que é o cemitério. Kalunga quer dizer, local onde residem os mortos, então, nessa "kalunga grande" os grandes mares, local sob domínio de Yemanjá, tem o povo que leva as almas até lá em seus barcos e são os marinheiros, então isso seria dizer que na encantaria esses espíritos assumem a forma fluídica de um marinheiro. Isso na Umbanda começou a criar uma forma e começamos a ver os marinheiros fardados e por aí vai; porém, isso não significa que o seu marinheiro, tenha realmente vivido num barco, lutado na primeira ou na segunda guerra. Isso não quer dizer que necessariamente exista a forma de marinheiro; é uma forma fluídica e uma forma de apresentação de espíritos que levam os recém desencarnados para a "kalunga grande",
Isso faz mais sentido se buscarmos na tradição grega por exemplo, onde existe o barco das almas e isso na encantaria também e se deu com a barcaça das almas então, as almas são colocados nesse barco que as leva até espiritualidade e quem leva esse barco são os marinheiros. Isso vai dar base e origem para nossa linha de marinheiro na Umbanda.
Vamos começar a falar sobre a linha propriamente dita dos marinheiros. Temos que entender que o principal trabalho do marinheiro é atuar na harmonia dos ambientes e levar as almas recém desencarnadas, mas isso é um trabalho espiritual; em terra, eles vem para ajudar no equilíbrio mental e psicológico, pois são ótimas entidades para trabalhar as depressões, síndrome do pânico e uma série de problemas psicológicos que enfrentamos no dia a dia. O marinheiro tem um trabalho exemplar na questão de harmonização do nosso campo mental, até mesmo porque eles atuam com Yemanjá. Mas não podemos afirmar que todos os marinheiros são de Yemanjá, temos marinheiros de todos os Orixás e de todas as linhas, é lógico que a sua maior influência é de Yemanjá sim. Yemanjá sempre estará com o marinheiro, mas podemos ter marinheiros de Yemanjá com Obaluaê, Yemanjá com Oxóssi, Yemanjá com Xangô e assim por diante. Além de Oxum que também tem uma grande influência dentro dessa linha, principalmente na dos pescadores. Além disso, não podemos esquecer que Ogum é um grande Orixá ligado aos marinheiros, principalmente a linha de Ogum beira-mar, Ogum sete ondas, Ogum sete mares ou Ogum Yara e tantos outros que atuam nos mares e no elemento água.
Então falar agora sobre uma coisa interessante, quando falamos dessa linha é que Ogum não trabalha na cor vermelha nessa linha e todas as entidades que entregam para Ogum ou que entrecruzam nessa linha, usam azul escuro. Por isso alguns usam azul escuro com branco e azul claro, mas tem outras também. Em regra geral, o marinheiro normalmente trabalha com a cor azul claro, seu campo de atuação são os mares, mas nós temos marinheiros que trabalham em rios lagos e lagoas, sempre no elemento água que esta presente na linha de marinheiro e eles manipulam esse elemento; a vela que a gente mais usa é a vela azul e branca mas podem usar outras cores de vela. Eles gostam muito também de ferramentas como areia da praia e água do mar em seus trabalhos e até mesmo o vidro de alfazema eles também usam bastante, e além disso os marinheiros são festejados no dia dois de fevereiro, dia de nossa Senhora dos navegantes.
Quando nós falamos em marinheiro, nós estamos falando de uma linha, a linha de marinheiro, só que você já deve ter notado quando você vai numa casa, que tem vários tipos de marinheiro, tem maneiro que usa quepe, outro que usa farda, marinheiro que usa chapéu de palha, que fuma cachimbo, ou cigarro, um que usa azul claro o outro azul e branco, outro gosta de azul escuro. Porque isso? É preciso entender que a linha é de marinheiro, mas toda linha de trabalho é dividido em falanges e a dos marinheiros é dividida em sete.
Vamos entender cada uma dessas falanges:
Vamos falar da primeira que é a maior falange dos marinheiros, são chamados de povo do mar, e na sua grande maioria são os marinheiros que foram realmente mais ligados ao militarismo, por mais que talvez eles nem tenham encarnado, usam elementos do militarismo, gostam de se chamar de capitão, de comandante, usam principalmente azul escuro e quase não usam azul claro em terra, usam quepes da marinha, usam lenços, fardas ou termos, sempre desta forma. Essa é uma linha pura de Yemanjá, porém Ogum também vibra bastante nessa linha. Eles são apadrinhados pelo Ogum beira-mar, por isso usam a cor azul escuro mas as vezes o azul claro. O seu principal símbolo é uma âncora, que eles carregam nas guias ou nas fardas; a guia dessa linha é sempre azul e branca, 7 contas azul escura e 7 brancas; as guias sempre de sete em sete, porque sete é um número ligado a Ogum e como foi explicado anteriormente, essa linha também se liga a Ogum. A bebida é o conhaque, que também é usado nas suas oferendas, gostam muito de fumar cachimbo, não gostando muito de cigarro ou charutos. Seu comandante é a entidade chamada de capitão do mar, nós temos vários marinheiros nessa linha e na maioria das vezes usam nomes como: Sete âncoras, marinheiro 7 mares, capitão, comandante e ETC. Eles usam principalmente as nomenclaturas do militarismo, além disso, a sua principal oferenda é sete pedaços de fumo de rolo cortados, um prato com areia da praia, além de uma vela azul escura e um copo de conhaque, essa é a oferenda que normalmente os marinheiros gostam. Esses marinheiros são muito fáceis de se perceber em terra, porque eles não são muito de conversar, ficam mais parado no canto deles, mas sempre se vê pela sua roupagem, são sempre daquela forma bem sutil, sempre com o peito aberto, normalmente de quepe, de farda e eles gostam dessa questão militar então por isso, são bem autoritários.
A próxima falange, é a segunda maior dentro dessa linha, que são os pescadores. Essa linha que é muito ligada à nossa mãe Oxum, gosta principalmente da cor azul clara, a maioria desses marinheiros é muito fácil você ver terra, pois além de serem os mais brincalhões, os mais conversadores e os que mais balançam na sua incorporação, usam chapéu de palha e lenços e na verdade não gostam muito de âncoras e símbolos ligados a essa questão militar. O símbolo dessa linha, é um leme e esses marinheiros não gostam de serem chamados de capitão e nenhum desses termos, gostam mesmo de serem chamados de irmãos e adoram trabalho principalmente com a parte mental. Gostam muito da pinga não gostam do conhaque e sua guia é sempre 7 azul clara e 7 brancas e essa guia chefiada pelo martim-pescador esse grande marinheiro que com certeza você já ouviu falar. Tendo a sua ligação com nossa Senhora Aparecida e com os pescadores que acharam a imagem da Santa, por isso usam o chapéu de palha. Não gostam muito do mar, diga-se de passagem esses marinheiros preferem mais os rios, lagos e lagoas, mas principalmente os rios. Preferem fumar o cigarro de palha e a sua oferenda é 1 coco verde, 3 copos de pinga e 1 vela azul-clara, essa é a oferenda dos marinheiros da falange dos pescadores.
Já a terceira falange que nós vamos abordar, é bem bem grande dentro da linha de Umbanda. É a falange dos marujos, ligados com Yemanjá, mas ligados também com Oxóssi, esses marujos são os mais encantados de todos, na sua maioria usam também uma farda normalmente azul-royal e gostam dos símbolos como estrelas. São principalmente marujos que não encarnaram como marinheiros em vida, mas sim atenderam essa roupagem fluídica, porque esses são os grandes resgatadores de almas, trabalhando principalmente na espiritualidade. Esses são os marinheiros mais parecidos com o culto da barquinha, alguns deles até usam cornetas, maracas e grandes cachinhos, mas mesmo assim eles ainda preferem o cigarro como seu fumo principal. Usam a cor azul-royal, mas também gostam principalmente da vela bicolor branca e azul, seu símbolo é a estrela de seis pontas dourada, sua guia é sempre 3 contas azul-clara e 1 conta branca, sua bebida principal é a água, lembrando que alguns fumam cachimbo também, o grande comandante dessa linha é o marinheiro zé da marujada. A principal oferenda para esses marinheiros, é feita com 7 fitas azul-clara, com 7 rosas brancas e 7 velas bicolor branca e azul, essa é a oferenda principal aos marinheiros chamados de marujos.
O povo da praia, outra linha dos marinheiros. Este povo que não é tão ligado à Yemanjá, mas é ligado a Oxum e Ibejí por mais que tem o nome de praia, e as pessoas podem achar "ele é do povo da praia ele não é de Yemanjá." Não, porque esses marinheiros gostam da foz dos rios, quando um rio termina, sempre acaba no mar e é ali que eles gostam de receber suas oferendas, no encontro das águas doce com a água do mar. São marinheiros também muito fáceis ver terra, são bem dançarinos, sempre de chapéu de palha também e gostam de usar lenço no pescoço. Além do cigarro de palha. Além disso todos eles, gostam de carregar balaios e cestos de palha, são muito ligados à figura de São Rafael, que era o pescador de almas. Esses marinheiros adoram flores, são ligados à encantaria e trabalham principalmente para o amor próprio, daí vem a ligação de Oxum com Yemanjá. Sua cor principal é o amarelo eles gostam de vela amarela, mas é lógico que sempre cabe uma vela amarela ou uma vela azul-clara, mas o amarelo é sua cor principal. Seu símbolo é o anzol, sua guia é sempre 3 contas azul-clara e 3 contas amarelas. Gostam de fumar cigarro de palha, bebem pinga e o grande comandante desta linha é o Chico Praiano. A oferenda é um cesto de palha cheio de flores, com água do mar e 7 velas sendo uma branca, 3 azuis e 3 amarelas e gostam bastante de mel nas suas oferendas.
Já a quinta linha que nós vamos abordar, é uma linha muito ligada à São Pedro, outro santo também que era um pescador. São Pedro é lógico que foi sincretizado com Xangô, então é uma linha dos marinheiros que são ligados a Yemanjá e a Xangô. Por mais que seja um Orixá do elemento fogo, os marinheiros dessa linha trabalham com o elemento água e com uma característica de cura, dentro da linha do oriente que a linha de Xangô, que também é uma orixá de cura e poucas pessoas sabem disso. Esses marinheiros trabalham além da cura na barca das almas e com o julgamento espiritual. Então são esses espíritos que recebem os recém desencarnados, o povo da lagoa, são os marinheiros que trabalham nas águas paradas. A cor principal deles, é a cor índigo, aquele azul quase roxo, além disso são muito próximos dos exús e muitos tem uma estreita ligação com os eles e acabam até usando alguma cor mais escura nas suas oferendas. O símbolo principal dessa linha é um barco, e a sua guia é 3 contas azul-escura e 3 contas azul-claro. A bebida principal é o vinho branco e eles gostam de fumar cigarro de palha. Essa linha quase não gosta de usar chapéu de palha e o principal comandante da linha é o marinheiro Zé da lagoa. Sua principal oferenda, são 3 velas brancas, areia do mar e sal grosso.
Outra falange muito grande dentro da área dos marinheiros, é a linha do povo do cais chefiados pelo seu Zé do cais, marinheiro bem conhecido dentro da Umbanda. Essa linha usa cor prata e é bem ligada à questão de nosso pai Obaluaê, principalmente de nosso pai Ogum que firma muito nessa linha, por isso que eles gostam muito de usar ferro nas suas firmações e elementos de metal. Gostam de trabalhar com correntes e âncoras também, mas o símbolo dessa linha é uma concha, outro grande elemento que usam bastante no seu trabalho. São ligados a São Cristóvão e é muito fácil você ver eles em terra, porque eles gostam de usar camisa e além disso eles gostam de usar chapéu, não chapéu de palha, mas aquele chapéu parecido com panamá, sempre com fita azul. Esses marinheiros são ligados não o mar e sim as encostas, gostam de receber suas oferendas nas encostas; o famoso na barra ou embaré que são aquelas pedras que ficam perto do mar e por isso que existe o Tranca Ruas da Embaré, um Exú de Ogum que trabalha ali. Gostam também de boinas, boinas escuras e aqueles gorros de lã. Sua bebida é o uísque, podem beber conhaque também, mas preferencialmente uísque e fumam charutos, lógico que você pode ver algum marinheiro dessa linha que fuma outra coisa. Sua oferenda é uma corda com 7 nós e 7 velas brancas com uma concha aberta com uísque dentro dela.
E pra encerrar a nossa sétima falange é ligada a Obaluaê e Exú, são chamados de piratas, sim, existem marinheiros que são da falange dos piratas mas eu digo desde já, eles não gostam daquele arquétipo do pirata de lenço, tapa-olho e perna de pau. Eles não gostam porque é muito contemporâneo e os marinheiros não tinham contato com isso os. Marinheiros dessa linha são os que trabalham mais à esquerda, muito próximo dos exús, trabalhando para descarrego energético e são ótimos para isso. Por esse motivo, eles usam a cor preta que é a cor dessa linha. Portanto, se você tiver um marinheiro que pediu uma vela preta não ache estranho. São muito ligados a Nossa Senhora da Glória, esta santa que também é Nossa Senhora dos Navegantes então, é um povo ligado ao mar e gosta também de receber oferendas bem próximo das praias. O símbolo é o punhal aliás, instrumento esse que eles gostam de usar gosto de usar punhal, espadas e instrumentos cortantes, porque usam em seus trabalhos de descarrego. Sua guia é sempre 3 contas azul-escura e uma preta, portanto não ache estranho se eles pedirem uma guia azul e preta. Sua bebida principal é o rum, o fumo é o cigarro mas também gostam de charutos, são chefiados por um marinheiro chamado 7 ondas o marinheiro que usa azul-escuro, branco e preto nas suas roupas, sua oferenda principal é rum, 7 moedas prateadas e 7 chaves, tudo colocado numa garrafa de vidro e entregue. Esses marinheiros aliás tem o costume sempre de pedir para o seu médium uma garrafa mesmo que seja vazia, para colocar os pedidos. A garrafa é um grande instrumento e uma grande ferramenta dessa linha.
Algo importante, principalmente para quem está em desenvolvimento, é deixar a identidade fluir da forma que ela quiser, não existe nada que seja traçado na Umbanda, nada que seja igual um faz que o outro deva fazer. Tem muito terreiro que quando chega numa linha específica, todos parecem xerox, cópias das mesmas entidades, porém isso não acontece dentro de uma falange, dentro de uma linha. Podemos ter vários marinheiros com cores diferentes, com formas diferentes, com ferramentas diferentes e com trabalhos diferentes. A Umbanda não é igual a matemática, que é uma conta exata onde todo mundo é igual. Aceite e deixe fluir a entidade da forma que ela quiser porque tem fundamento. Agora se você quer conhecer mais sobre os marinheiros, essas grandes entidades que não tem nada de bêbado e são maravilhosos para o nosso equilíbrio espiritual, procure um terreiro.
Saravá fraterno...Axé!
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